Capítulo 3

- Ah Sarinha... Ainda não acredito que você vai embora, minha querida. Vai ser tão difícil ficar aqui sem você durante a semana!
- Beatriz, pare com isso! Deixe a menina estudar em paz! Pelo menos estaremos livres daquelas músicas malucas que ela anda ouvindo.

O vovô odiava meus folclores... É, admito que não são muito parecidos com as músicas italianas que eles sempre colocavam para tocar, mas...

- Você sabe que estou brincando, não é Elizabeth? O capitão Jack estará sentindo sua falta.

Desde quando assistimos “Piratas do Caribe”, ele insistia em me chamar de Elizabeth. Definitivamente, meu avô é uma figura!

A melhor parte dessa despedida toda foram as caras que o papai fazia! Ele parecia cada vez mais indignado com aquele drama todo, ele sempre odiava quando meus avós começavam com mimos comigo... E quem via até chegava a pensar que ele não fazia nada daquilo comigo, mas no fundo acho que era até um pouquinho de ciúme.

- Sr Mateus! Ela só vai morar comigo, não vai se mudar para outro país. Continuaremos vindo sempre aos finais de semana, vocês nem terão tempo para sentir saudades da Sara. Não precisamos fazer essa cena toda...

- É verdade, vô. Preciso conhecer outros mares, capitão! Como serei uma pirata experiente se ficar apenas ancorada?

Todo mundo fez uma cara de “ué” fenomenal, só o vovô entendeu. Tudo bem, era essa mesma a intenção.

Dei um abraço apertado na vó Bia, e um mais apertado ainda no vô Mateus. E é claro que eu chorei, como não fechar aquela cena toda senão com um monte de lágrimas?

Entramos no carro, papai e eu, rumo ao meu futuro. Ahhhh, que medo!
***

- Filha, você vai adorar nosso apartamento! Durante esse mês, aproveitei para consertar umas coisinhas, já que você estava vindo para cá. Olha só este papel de parede que ele coloquei no seu quarto, é a sua cara!

Meu quarto era demais! Nunca tinha sonhado com um cantinho tão “minha cara”. As paredes eram brancas da metade para cima, e da metade para baixo o papai colocou um papel de parede cheio de coisas escritas em várias línguas, a impressão que dava era de que tinham escrito na parede com letra cursiva e pincel daqueles antigos de molhar a pena no potinho (sempre quis escrever coisas nas paredes do quarto... Deve ser uma sensação ótima, não é?).

Os móveis eram escuros, uma escrivaninha pequena e uma cama pequena também, mas tudo muito fofo e apertadinho, pois o quarto era metade do meu lá na casa do vovô. A cortina era azul, da mesma cor das letras na parede, e eu fiquei encantada... Puxa, como o papai tinha bom gosto para decorar ambientes! Se bem que... ai ai ai...

- Pai, você fez tudo isso sozinho?
- Hã?... Mas... Sim, claro, filha. Fui eu quem... ah... instalou tudo.
- Não, papai. Estou me referindo a idéia... Foi você quem escolheu tudo? As paredes, cortinas e...

Ouvi um barulho estranhérrimo, parecia alguém roncando com soluço! Consegue imaginar? Isso, exatamente, algo de assustar. O papai começou a se apalpar, procurando alguma coisa. E foi só aí que eu entendi que era o celular, e que o som extraterrestre era o toque dele.

Ele saiu para atender, mas todos os bichinhos já começaram a percorrer todos os departamentos da minha mente, trazendo as informações para eu chegar à terrível conclusão de que alguém do sexo feminino tinha ajudado ele a decorar aquele ambiente... E precisava ser alguém que soubesse de coisas sobre mim, porque era feito sob medida!

Respirei fundo e tentei desviar minha criatividade ativada à base de pessimismo para a possibilidade de ter sido obra de uma decoradora, ou um decorador gay que tivesse muitíssimo bom gosto (eles são sempre muito bons para essas coisas, né?).

Gente, aquela ligação demorou um século! Minha mente já estava num estado caótico, só de pensar que o papai pudesse estar... tendo... uma... namorada!!!!!

- Pai, você tem namorada?

Sem brincadeira, acho que ele deve ter ficado meio bege.

- Filha, sou viúvo há quase dezesseis anos... Dezesseis!
- Eu sei pai... mas você lembra quando eu te disse que estava namorando? Você ficou uma arara! E eu já tinha os mesmos dezesseis anos!
- Sara, você sabe que é diferente. Mas não se preocupe com isso agora, vamos continuar sendo nós dois em primeiro lugar, sempre.
- Ta bom, pai... Eu sei que as coisas funcionam assim, mas é que eu vou sentir muito ciúme, vou odiá-la e achar que ela é ridícula e gorda, por mais bonita e simpática que ela seja.

Ele riu, e mudamos de assunto. Mas conforme ele ia falando, eu ficava imaginando ele abrindo a porta do carro para ela entrar. Depois, ele dando beijos nos pés dela, e depois... Ah! Credo!

Tem algo sobre mim que vocês precisam saber: eu sou MUITO ciumenta. Acho que já deu para notar.

Enfim, namoradas a parte, fiquei sozinha no quarto arrumando e conhecendo todas aquelas paredes novas, um lugar tão estranho, mas que abrigaria tudo o que se passava em mim dali para frente.

Comentários

  1. Tá ficandomuito bom, mocinha!! É exatamente isso q eu admiro em vc, essa capacidade de escrever coisas desse gênero!!!!Qtos capítulos tem essa história?! Saudades!!!! BJS

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